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"Amadureci ou amargurei?"

Grupo Reinserir

Desde que ouvi esse questionamento, ele ecoa em mim com frequência: amadureci ou amargurei? Aos trinta, não é só o corpo que muda, são também as expectativas que se tornam mais duras.

O que parece amadurecimento, muitas vezes, é só o acúmulo de renúncias empurradas goela abaixo. A lista do que “não podemos mais fazer” cresce com os anos: não pode mais sair demais, vestir demais, ousar demais, experimentar demais.

Frases como “não tenho mais idade pra isso” se repetem como se fossem verdades absolutas e muitas vezes vêm carregadas de uma moralidade disfarçada de autocuidado.

Sim, o corpo muda. O cansaço chega mais cedo, a ressaca dura mais, e escutar os próprios limites é parte importante do processo de amadurecer. Mas há uma diferença entre respeitar nossos ritmos e transformar esses limites em regras rígidas — regras que, no fundo, dizem menos sobre saúde e mais sobre adequação. Aos poucos, esse modo de viver nos tira de espaços importantes. De encontros, de trocas, de rituais coletivos de prazer e presença. O que era festa vira exagero. O que era pausa vira preguiça. O que era liberdade vira risco. E com isso, não só nos afastamos dos outros, mas vamos também esvaziando os sentidos.

É como se a passagem do tempo viesse acompanhada de um script de contenção. Como se crescer significasse apenas caber.

Mas caber onde? E pra quê?

Essa normatividade disfarçada de maturidade serve menos para proteger e mais para padronizar. Quem não se ajusta é lido como imaturo, irresponsável, ou até ridículo. O desejo de continuar experimentando, testando, errando — que deveria ser preservado como potência de vida — vai sendo silenciado em nome de um ideal de estabilidade que, muitas vezes, não é nem nosso.

Amadurecer deveria ser sobre sustentar escolhas com mais consciência, não sobre perder o direito à espontaneidade. O problema é quando o “amadurecer” é colonizado por um modelo de vida idealizado, onde a leveza dá lugar ao cansaço, e a alegria vira ruído.

É possível amadurecer sem se amargurar, mas talvez isso exija desobedecer. E reaprender a ocupar, com presença, os espaços que ainda nos fazem sentir vivos.

Imagem de @lupiiino