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Quando o cuidado fere: o impacto de falas desumanizadoras na saúde

Grupo Reinserir

Em muitos contextos hospitalares e de atenção à saúde, o diálogo entre profissionais acontece de forma rápida, no meio da correria e da pressão diária.

Mas, em meio a essa rotina intensa, por vezes surgem falas que, longe de contribuir para o cuidado, reforçam estigmas e afastam ainda mais quem já está em sofrimento.

Quando um paciente perde a vida ou tenta o suicídio, a reação esperada de uma equipe de saúde deveria ser de acolhimento, reflexão e respeito. No entanto, ainda é comum ouvir comentários carregados de julgamento, comparações desumanas ou insensibilidade diante da dor alheia. Expressões como “tem gente querendo viver e outros se matando” ou narrativas que colocam o paciente como “culpado” por seu sofrimento não apenas negligenciam a complexidade da saúde mental, como também ferem princípios éticos fundamentais da profissão.

Essas falas não ficam restritas aos corredores. Muitas vezes, chegam aos ouvidos dos próprios pacientes e quando isso acontece, o dano é profundo. Para quem está lutando contra pensamentos suicidas ou vivendo um quadro grave de sofrimento psíquico, ouvir que seu sofrimento é menos legítimo, ou motivo de deboche, pode intensificar sentimentos de culpa, vergonha e isolamento.

Profissionais de saúde, independentemente da área, precisam reconhecer que a palavra também é ferramenta de cuidado. O que se diz, e como se diz, pode fortalecer um paciente em sua luta pela vida ou empurrá-lo ainda mais para o abismo. O compromisso ético não se resume a procedimentos técnicos: envolve também zelar pelo ambiente emocional e simbólico que se constrói em cada interação.

O cuidado exige ética, escuta e uma consciência constante de que, para além do diagnóstico, existe uma história, uma vida e um direito inegociável à dignidade. Transformar a cultura institucional para que o respeito seja a regra - mesmo nas conversas de bastidores - é parte do nosso dever enquanto trabalhadores da saúde. Afinal, reafirmar a vida começa também pela forma como falamos sobre ela.

Imagem de @brenoloeser